Brasileiros em Sydney: Como Usar

     Originalmente criado como espaço para compartilhamento de informações e integração entre os usuários, o grupo no Facebook dos Brasileiros de Sydney tem sido palco de discussões ferrenhas e de intermináveis polêmicas nos últimos tempos. Com tanta informação inútil que já rola na minha timeline, eu mesma já cogitei sair desse grupo. Assim direcionaria minha tão limitada atenção pra assuntos que de fato são do meu interesse – que não incluem a aprovação do visto de indivíduos cuja existência eu até então desconhecia…

     Permaneci no grupo por um motivo bom e outro nem tanto. O bom diz respeito ao meu interesse genuíno nas conexões e trocas estabelecidas pelas redes sociais que, se bem utilizadas, são uma mão na roda e a mim já ajudaram bastante. O motivo não tão bom de eu ter permanecido no grupo tem um pouco a ver com aquela porção de espírito de porco que todo mundo tem um pouco… A mesma que nos faz passar devagarzinho por um acidente, ou baixar o volume da tv pra ouvir a briga dos vizinhos. No caso do grupo, não quero necessariamente ver tragédia, mas sim saber qual é o paranauê do momento. Talvez não seja nem espírito de porco e sim tenha a ver com aquilo que todo mundo busca, principalmente estando longe de casa, que é a sensação de pertencimento. Ou talvez seja falta do que fazer mesmo, admito.     

Problema dessa geração?

     Sempre que vejo alguém no grupo perguntando “onde compra caderno aí?”, “qual é o melhor lugar prá comprar blusa branca?” ou “tem veneno prá barata na Austrália?”, me desperta uma ponta de desilusão com meus compatriotas – essa gente a quem, em geral, eu tanto admiro. Me pego refletindo comigo mesma: como esse pessoal vai se virar do outro lado do mundo se não consegue tomar decisões básicas sem precisar consultar outros 35 000 estranhos? Será que eles já experimentaram sair de casa e procurar o que precisam?

Problema da minha geração?

     Quando esse senso crítico vem a minha mente e me flagro pensando que “no meeeeu tempo de intercâmbio…”, há 13 anos, quando o Orkut tava ainda engatinhando e o pessoal fazia fila prá usar 15 minutos dos computadores das bibliotecas, os intercambistas descobriam tudo por conta própria, ou perguntavam pro vizinho, chefe, pra tia da biblioteca… Eles batiam perna, falavam com estranhos, acertavam na base de tentativa e erro. E no fim tudo dava certo – os imigrantes mais velhos que o digam! 

     Mas como achar que no passado as coisas eram melhores é muito pensamento de vó, tento ver o lado positivo dessa interação. Acabo por concluir que sim, pedir referências e compartilhar experiências é uma troca que contribui, e muito, na vida das pessoas, especialmente quando estão no exterior. Ao que tudo indica, cada vez mais a gente conta com indicações uns dos outros antes de comprar algo, escolher um restaurante, planejar as férias ou contratar um serviço.

     Até aí tudo ok. O problema é quando todo mundo quer saber tudo, daí é mais conveniente lançar uma pergunta pela milésima vez, que já foi respondida quinhentas vezes, do que fazer as pesquisas por conta própria né? Nesse caso, uma ferramenta que poderia facilitar nossa vida e agilizá-la, corre o risco estar criando uma penca de preguiçosos, que mais polui o grupo e timelines alheias do que de fato agrega.

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 Tópicos repetidos vão acabar?

     Com essa tendência de todo mundo querer ter certeza de tudo, somado ao o cenário dinâmico em que as informações mudam, sempre terão tópicos reincidentes. É bobagem esperar que seja diferente em um grupo com dezenas de milhares de membros que estão em trânsito constante. Felizmente, tem gente se dando conta dessa oportunidade e criando grupos mais focados, guias para brasileiros e afins.  

     O que o pessoal precisa saber é que há uma diferença entre “estou procurando emprego, se alguém souber de algo me manda inbox” e “distribui currículo nos lugares x, y e z mas ainda não consegui nada, alguma recomendação do que funcionou com vocês?”. Essas abordagens ilustram não apenas distintas posturas nas redes sociais como também uma diferente atitude na vida.

Agora o problema agora não são as perguntas repetidas, mas a agressividade dos haters

     Desde que rede social é rede social, sempre vai ter alguém sem noção destilando ódio e “bullynando” todo mundo. Isso não exclusivo de brasileiro, nem quer dizer que devemos ser coniventes com comportamentos que levam a zoeira além dos limites. Tem muita gente desocupada que, ao invés de sentar a bunda na cadeira pra escrever um textão porque acha que tem algo importante pra falar (sim, tipo eu…), senta a bunda na cadeira prá fomentar ainda mais agressões e extrapolar os limites do deboche.

“Eu sou do bem mas achei muito sem noção esse post e quero registrar minha opinião”

     As redes estão abertas pra todo mundo dar seu ponto de vista, seja ele positivo ou não. Pessoas do bem também estão livres pra fazer críticas, elas fazem e devem fazer mesmo. Se o administrador do grupo tiver saco, vai viver moderando os comentários com base nos julgamentos de certo e errado dele – até que o grupo se torne um microcosmo comunista online, todos se amem, concordem com tudo e vivam felizes para sempre. 

“Se duas pessoas pensam sempre exatamente iguais em uma equipe, uma delas é desnecessária.”

“E agora, tenho medo de postar alguma dúvida e ser motivo de chacota”

     Usemos o bom senso então. Imagine que você mora em uma daquelas cidades muçulmanas cheias de alto-falantes. Umas cinco vezes por dia eles tocam uma oração. Além de você, lá residem outras 35 000 pessoas. Assim como as preces, tudo que sai pelos alto-falantes é ouvido por toda população. Nessa situação hipotética, você pensaria duas vezes antes de pegar o microfone, certo?

 Pois é mais ou menos esse o cenário do grupo dos brasileiros em Sydney. E por que no grupo essa lógica de pensar antes de pegar o “microfone” não se aplica? Porque no mundo virtual é mais fácil, a exposição é menor ao não precisar falar pessoalmente em público – é o que prega o senso comum.

     Daí o que acontece?

     Pessoal segue esse raciocínio e saí postando sem pensar muito na repercussão que um post polêmico pode ter. Posta o que quer, e acaba lendo o que não quer. Brotam os haters, apedrejando todo mundo que teve coragem (ou falta de bom senso, chame do que quiser) de se expor.

E todo mundo quer se preservar né?

     Seja numa cidade muçulmana, numa festa lotada, mesa de bar, reunião de trabalho ou grupo do Facebook. Depois de chegar, sempre vale a pena dar um tempinho pra checar a temperatura e sentir o clima do local. Essa lição eu mesma escapei recentemente. Fui aceita num grupo sobre criação de websites, estreei com minha pergunta besta de quem não entende nada do assunto, e fui recebida com uma bela voadora virtual. Eu podia ter me poupado? Talvez. Eles foram mal educados? Sim. Pedi desculpas e nunca mais de as caras…

Não precisa pedir pras pessoas ignorarem posts ruins

Sabe por quê? Porque a maioria esmagadora das pessoas já está ignorando os posts polêmicos. Só que tudo que conseguimos ver é o registro escrito que deixam, daí dá a impressão de que todos participantes estão lá prá descer o cacete. Portanto, mesmo quando um determinado post recebeu 3500 comentários (que é bastante), na verdade 90% do pessoal tá quietinho nos bastidores, ou nem sequer sabe o que tá acontecendo…  

E agora, o que deve ser postado no grupo?

     Até onde eu sei, cada um continua postando o que quiser: assunto útil, inútil, informação importante, pedido de essay, de ajuda, de casamento… Creio eu que tá liberado fazer pirueta, reclamar das baratas, do preço da cachaça, da vida de labour ou do que quiser… É justamente essa variedade e as discussões que fazem do grupo tão rico e o torna tão ativo – ao contrário de vários outros grupos de brasileiros no exterior, quase sempre mais parados do que água de poço…

     Com o sucesso e proporção que o grupo tomou, é de se esperar que volta e meia as coisas virem bagunça e fiquem fora de controle, infelizmente. Somos muitos, o grupo é um pequeno retrato do país miscigenado e diversificado da onde viemos. Fazemos muito barulho, queremos todos dar nossa opinião. Assim são os encontros das famílias brasileiras. Fala-se muito, fala-se alto; seja em casa, nos churrascos, no bar, no aeroporto… e no mundo virtual.

     Estamos todos vivendo uma das experiências mais incríveis da nossa vida, é compreensível que queiramos compartilhá-la, é natural estarmos inseguros atrás de respostas. Felizmente, nem só de casos ruins é feito o grupo – esses, na verdade, são exceções que acabam reverberando mais do que deveriam pelo caráter polêmico que têm. No geral, vejo um sem número de gente do bem.

     Espero que os mal intencionados não inibam a participação espontânea de tanta gente criativa, descontraída e que se ajuda de verdade. E que quem tiver a braveza de postar algum assunto polêmico conte com essa mesma casca grossa pra aguentar as possíveis críticas que fazem da internet por vezes um espaço tão hostil. E boa sorte pro moderador pra segurar a onda antes que ela vire um tsunami!

In spite of everything, I still believe people are really good at heart. Anne Frank

Texto: Natália Godoy

O texto representa apenas a opinião da autora, que não é expert em comportamento humano, nem de haterslovers, brasileiros ou redes sociais.  Tampouco é criadora/administradora do grupo Brasileiros em Sydney, nem mesmo estipula as regras dele. (Isso mesmo, fez o textão só prá dar palpite.) Gostou, discorda, ou tem algo a agregar? Escreve aí!  

3 comentários sobre “Brasileiros em Sydney: Como Usar

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